QUESTÃO 1
Leia o texto a seguir.
ONDE JÁ SE VIU?
Tatiana Belinky
Uma tarde de inverno, estava eu lá, na Rua Barão de Itapetininga, mexendo nas estantes de uma livraria. (Não consigo passar por uma sem entrar para fuçar no meio dos livros. Desde que eu tinha quatro anos de idade – o que já faz muito tempo – livro para mim é a coisa mais gostosa do mundo. A gente nunca sabe que surpresa vai encontrar entre duas capas. Pode ser coisa de boniteza, ou de tristeza, ou de poesia, ou de risada, ou de susto, sei lá. Um livro é sempre uma aventura, vale a pena tentar!) Pois bem, estava eu ali, muito entretida, examinando os livros, quando de repente senti que alguém me puxava pela manga. Olhei para baixo e vi um menino – um garotinho de uns nove ou dez anos, magrelo, sujinho, de roupa esfarrapada e pé no chão. Uma dessas crianças que andam largadas pelas ruas da cidade, pedindo esmola. Ou, no melhor dos casos, vendendo colchetes ou dropes, essas coisas. Eu já ia abrindo a bolsa para livrar-me logo dele, quando o garoto disse: Escuta, tia... (naquele tempo, ninguém chamava a gente de tia: tia era só a irmã do pai ou da mãe). O quê? perguntei. O que você quer? Eu... dona, me compra um livro? disse ele baixinho, meio com medo. Dizer que fiquei surpresa é pouco. O jeito do menino era de quem precisava de comida, de roupa, isso sim. Duvidei do que ouvira: Você não prefere algum dinheiro? perguntei. Não, dona disse o garoto, mais animado, olhando-me agora bem nos olhos. Eu queria um livro. Me compra um livro? Meu coração começou a bater mais forte. Escolha o livro que você quiser falei. As pessoas na livraria começaram a observar a cena, incrédulas e curiosas. O menino já estava junto à prateleira, procurando, examinando ora um livro, ora outro, todo excitado. Um vendedor se aproximou, meio desconfiado, com cara de querer intervir. Deixe o menino escolher um livro falei. Eu pago. As pessoas em volta me olhavam admiradas. Onde já se viu alguém comprar um livro para um molequinho maltrapilho daqueles? Pois vou lhes contar: foi exatamente o que se viu naquela tarde, naquela livraria. O menino acabou se decidindo por um livro de aventuras, nem me lembro qual. Mas me lembro bem da minha emoção quando lhe entreguei o volume e vi seus olhinhos brilhando ao me dizer um apressado obrigado, dona! Antes de sair em disparada, abraçando o livro apertado ao peito. Quanto aos meus próprios olhos, estes embaçaram estranhamente, quando pensei comigo: “Tanta criança rica não sabe o que perde, não lendo, e este menino pobre que certamente não era um pobre menino sabe o valor que tem essa maravilha que se chama livro!” Isso aconteceu há vários anos. Bem que eu gostaria de saber o que foi feito daquele menino...
Tatiana Belinky. Onde já se viu? In: _ Olhos de ver. 3.ed. São Paulo: Moderna, 2004. P. 19-21.
Um dos elementos essenciais de uma crônica é o tratamento de situações cotidianas de maneira breve e objetiva. Além disso, a narrativa geralmente ocorre em um período de tempo específico e limitado. Com base nessas características, pode-se afirmar que o tempo da narrativa deve: